Incógnita: a novela que não parece novela | Crítica



FICHA TÉCNICA

Produção: Novela
Ano: 2020
Autor: Mister Hudson
Emissora: Web Novelas Channel

Criticado por Kax

 

E aí, pessoal, tudo bem com vocês? Sobreviveram a 2020?

Pois bem, que saudades que eu estava o Analisando a Concorrência e dessa, digamos, informalidade e pessoalidade que o formato raiz do programa sugere.

 

E na minha estreia aqui, fui humildemente convocado a resenhar sobre uma novela que me chamou atenção no Web Novelas Channel. História essa que destoa do padrão do canal, outrora conhecido por sua dramaturgia cômica e forte apelo emocional, de particularidade única. Eis que me deparo com o texto de Incógnita e me espanto com a narrativa sutil, focada nos personagens principais e diálogos cult.

 

Lia os capítulos na expectativa de me perder em núcleos paralelos que nada acrescentam e sujeitos vazios com fazes sarcásticas alá sitcom de (algumas) séries americanas. Me frustrei, ainda bem.  

 

Incógnita conta a história de uma família de aparências e uma morte misteriosa: a de Emiliano Figueiredo Silva, nas proximidades do Largo São Francisco. A polícia começa a investigar a causa do incêndio e chega a três suspeitos com possível relação direta com o óbito da vítima: sua esposa (Larissa), seu filho (Ronaldo) e seu irmão (Humberto).

 

Não vou mentir que, no início, as vezes o diálogo rebuscado me incomodava. Mas logo entendi o contexto e com o passar dos capítulos foi ficando mais natural. 

 

Outro quesito que deixou a desejar, foi a famigerada ambientação. Sabe quando o autor diz pra você “Larissa ingressa na mansão, junto a Humberto” e imediatamente inicia a conversa? Pois bem, o que você imaginaria no ambiente? Eu imagino uma sala branca, grande (por ser uma mansão) e um sofá cinza no meio. Mais nada. Será que o autor teve um pensamento de ambientação parecido com o meu, ou ele imaginou – uma sala grande de cor bege com lustres de luzes quentes, janelas blindex parcialmente encobertas por cortinas coral, com sofá estofado, de mesma cor, almofadas e tapete peludo em baixo da mesa de centro de sala e uma escadaria ao fundo, perto do acesso a cozinha?

 

Lembrando aqui que não é necessário descrever a mesma coisa sempre que uma cena se passar na sala, por exemplo. Porém, pelo menos uma vez, de preferência assim que um ambiente novo for apresentado aos leitores, é preciso que informações como essa sejam dadas para estimular o pensamento e a imaginação de quem lê.

 

Outro exemplo disse é na cena 5 do capítulo 2, quando Ronaldo se exalta e Larissa é consolada por Humberto. Instantes depois, eles ouvem sirenes de polícia, vão pra janela e observam Ronaldo sendo abordado pela polícia. Mas em momento algum nos foi dito que ele saiu do ambiente, desceu as escadas e andou até seu carro. Eu fiquei: “como ele foi parar ali?”

 

CAPÍTULO 2 / CENA 5 - INCÓGNITA

 

Ronaldo: - Por causa de tudo isso...eu fiz muita “merda” nessa vida..., mas ele deu forças pra fazer uma que eu nunca...nunca vou me arrepender.

 

Larissa: - Filho! Ronaldo!

 

(Humberto segura Larissa)

 

Humberto: - Calma, calma, shiu...ele tá de cabeça quente. Eu entendo, eu entendo. Adolescente revoltado

 

(Larissa interrompe Humberto)

 

Larissa (raivosa): - Revoltado? Ele já não tem mais sentimento, assim como eu perdi os meus. O Emiliano acabou com o meu “eu”. Toda aquela sensibilidade, aquela...jovialidade, a esperança de construir uma vida digna e feliz, foi devastada como um incêndio devora uma floresta...e como acabou com a vida daquele infeliz.

 

Humberto: - O mais importante é que tudo isso uniu a gente, hum? Foi nosso irmão que nos uniu, de certa forma.

 

(Larissa se levanta e encara Humberto, friamente)

 

 Larissa : - Nosso elo...nosso elo, de verdade, começou depois que eu conheci o seu irmão. O.../ (corta)

 

(Larissa é interrompida por uma sirene de um carro policial. Ela e Humberto se apoiam no parapeito da janela e observam Ronaldo sendo abordado por policiais, que revistam o seu automóvel).

 

FIM DA CENA

 

E não foi só ne cena que o autor se descuidou. Outro erro, e dessa vez mais grave foi na cena 11 do capítulo 5.

 

A intensão de Larissa era dopar o delegado Eduardo pra conseguir vasculhar sua casa em troca de pistas. Ele desconfia e finge que bebe a taça de vinho que ela lhe dá. Momentos depois ele encena um falso desmaio, Larissa aproveita para revistar seu quarto, no entanto, é flagrada pelo próprio. 

 

TRECHO – CAPÍTULO 5 / CENA 11 – INCÓGNITA

 

Larissa assente com a cabeça. Ela entrega a taça ao Delegado, que as troca e despeja todo o vinho da taça que era de Larissa, dando a falsa impressão de ter tomado tudo. Ele pigarreia para disfarçar o som. A socialite se vira e, ao retornar se surpreende com o cálice vazio, expandindo um sorriso esperto, com a certeza de que o plano havia dado certo.

 

Larissa: - Mas já virou a taça?

 

Dr. Eduardo (misterioso): - Lembrar do passado me deu sede...sede de Sangue...

Larissa gela.

 

Dr. Eduardo: - de Boi, é claro.

 

Larissa coloca o pedaço de queijo entre os dentes do Delegado. Ele começa a mastigar, mas se engasga logo em seguida, tropeçando. Ele tenta se segurar no batente vitrô e se ajoelha, em clara posição de desmaio.

 

Larissa (em um misto de medo e satisfação): - Eduardo (T) o que tá acontecendo, Eduardo?

 

O corpo do Delegado despenca contra o chão, desmaiado, de bruços e olhos cerrados. A câmera acompanha Larissa apanhando o celular em sua bolsa e começa a vasculhar a casa.

 

FIM DA CENA

 

O que acontece depois do flagrante é que Larissa, simplesmente, desmaia:



TRECHO – CAPÍTULO 6 / CENA 1 – INCÓGNITA

 

Larissa (nervosa, confusa): - Eu (T) eu (T) estava (T) estava procurando algum medicamento, alguma coisa para te ajudar, você estava desmaiado, eu não podia (corta)

 

A socialite começa a ficar cada vez mais ofegante. A luz da câmera do celular, com a tela já bloqueada, reflete em vários cantos do quarto, acompanhando o efeito descontrolado que o sonífero causa em seu corpo. Num rompante, ela desmaia, desacordada, sobre a cama de Dr. Eduardo.

 

FIM DA CENA

 

Em nenhum momento no texto, o autor relata que Larissa tomou o vinho trocado por Eduardo. Uma informação crucial, simplesmente ignorada.

 

Mas vale ressaltar que, como um todo, Incógnita foge dos padrões novelísticos ao se parecer mais como uma série/minissérie. Talvez fosse inspirada em “O Rebu” da Globo, que seguia a mesma linha: um crime, alguns suspeitos e um drama familiar. O que diferencia a web novela da produção global é o foco absoluto em 4 personagens.

 

A narrativa é ágil, porém, algumas coisas me pareceram forçado, como o plano de Larissa de seduzir o delegado e ele aceitar sem hesitar. Tudo isso em uma única cena; faltou uma construção.

 

Um ponto a se realçar: nenhum capítulo é arrastado. Sempre há um gancho forte, atrativo, para fazer o leitor querer ler o próximo. Por ser um enredo focado em 4 pessoas, não há brechas para se perder na história. Os flashbacks ajudam a compreender parte do mistério e nos faz criar teorias sobre o que de fato aconteceu.

 

Uma das teorias é que talvez, Ronaldo não seja filho biológico do cirurgião, Emiliano, mas sim de uma relação extraconjugal de sua mãe.

 

A novela brinca com o imaginário do leitor. Uma hora você suspeita de um, depois de outro. E quando você tem certeza, ela faz questão de mudar tudo.

 

Se bem que eu acho que quem matou Emiliano foi o delegado.

 

Enfim, li tudo mas terminei sem respostas. A novela terminou no capítulo 7 (especial), mas não respondeu todas as indagações que propôs. Não sei se é porque encerrou sua temporada e terá uma continuação; ou se o autor parou de postar e encerrou por ali mesmo.

 

Por um lado, isso é bom. Deixando esse ar de mistério que a novela se esbaldou, fazendo o público criar teorias a respeito disso ou aquilo; igual as séries. Mas por outro lado, pode causar desinteresse de novos leitores que podem não querer acompanhar, justamente por saber que não terá todas as respostas esperadas.     

 

Minha nota é 3/5, e deixo o convite pra quem quiser acompanhar. Até a próxima! 




Nota 3,0

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